Eis que, no supermercado, entra um jovem de 20 anos. Seu nome é Joãozinho Ancap. Ele é libertário, anarcocapitalista, minarquia, agorista, ontarquista, anarcorandianista e atualmente ele estuda os segredos da seita esotérica do anarcoluffysmo.
Joãozinho Ancap é um jovem radicalizado por algoritmos de redes sociais, que, são usados por agências de inteligência ligadas a OTAN, como ferramenta de conflito permanente não convencional de atrito informacional.
Todas as ideias de Joãozinho Ancap, julga ele, são suas. Mas, mal sabe ele, que ele foi treinado por algoritmos para ter as ideias que ele tem. Algoritmos que identificaram nele duas coisas 1) um viés ideológico liberal e 2) problemas de saúde mental como um autismo leve com hiperfoco. Depois de horas e horas ouvindo podcasts enquanto jogava League of Legends, Joãozinho decidiu, por “livre” vontade que é um anarcocapitalista.
No mercado…
Joãozinho segue as compras e vai colocando as coisas no carrinho passando pelos corredores, ele olha os produtos e começa a reclamar mentalmente do preço dos impostos. Seu cérebro autista com hiperfoco começa a sair da realidade e, sonhando de olhos abertos, Joãozinho Ancap começa a imaginar como seriam os preços das mercadoria se não existissem os impostos. Ele diz para si mesmo “ai ai como pode as pessoas não terem visto que o problema é o estado ai ai como explicar…”.
Eis que ele chega no corredor das pastas de dente.
Lá Joãozinho Ancap prepara-se para colocar no carrinho a pasta que normalmente ele gosta de comprar, a pasta de dente da marca close-ápi mas, com a pasta de dente em mãos, ele para e lembra-se de um detalhe muito importante.
Dias atrás essa pasta de dente close-ápi colocou na televisão uma propaganda que envolvia um travesti em uma escola infantil escovando os dentes das crianças. Uma propaganda muito colorida, divertida e inclusiva que é um modelo a ser seguido pela sociedade ocidental de nosso tempo. Joãozinho Ancap porém, vê nisso um problema.
Ao invés de entender que colocar um homem vestido de mulher em um ambiente escolar infantil é algo muito saudável Joãozinho Ancap pensa o contrário. Ele acha um absurdo: “Onde já se viu botar travesti em propaganda de crianças! Eu sou Libertário Cristão! Isso é uma ofensa a Deus! Isso está errado!”.
(Sabe-se lá Deus o que seria isso de libertarianismo cristão… talvez seja um ramo novo do protestantismo? Mas, sigamos a estória.)
Cheio de seus preconceitos, Joãozinho Ancap não consegue aceitar e resolve tomar uma atitude. Olhando para a pasta de dente close-ápi ele diz para si mesmo uma frase que os algoritmos o ensinam a dizer, uma frase voluntarista bastante em voga dentro do movimento libertário:
“Ninguém deveria ser obrigado a comprar nada. Eu vivo em um mundo livre, vou exercer o meu direito ao boicote sobre esse produto. Viva o voluntarismo!!”
Joãozinho Ancap então põe a pasta de dente no lugar de onde tinha pego, pega outra e vai-se embora, com a sensação de que mandou, com a sua não compra, uma mensagem de reprovação a empresa que, sentirá o baque e irá recuar caso muitas pessoas façam isso.
Joãozinho Ancap exerceu o seu direito ao boicote, fez uma escolha voluntária e saiu do mercado com sua crença na verdade do libertarianismo renovada. Final feliz… ou será que não?
Mas o que Joãozinho Ancap não sabe? Onde está o erro de Joãozinho?
O erro está em Joãozinho não perceber a complexidade das cadeias produtivas do mundo globalizado do fim da história. O mundo onde ele está.
Geralmente quando um libertário fala sobre comércio é sempre usado um exemplo simples. Um carrinho de venda de cachorro quente, por exemplo. Nunca é um exemplo complexo. E, nunca vai ser um exemplo complexo por que no mundo complexo a teoria libertária não funciona.
Voltemos ao exemplo da pasta de dente.
A marca close-ápi NÃO é a real dona de si mesma. Ela não é uma entidade autônoma possível de ser voluntariamente boicotada. Se você quiser saber quem é a real marca dona daquele produto o que você precisa fazer não é olhar a frente do produto, o que você precisa fazer é virar a embalagem e olhar no verso.
A marca grande, na frente do produto onde diz "Close-ápi” no fim das contas não importa muito para saber quem é o dono, ela é mais uma sinalização ao consumidor sobre qual produto está dentro daquela embalagem. O que importa para saber o dono é a marca pequena no verso. Vamos supor que, para fins de exemplo, no verso da pasta de dente close-ápi está desenhado um pequeno U no canto inferior direito.
Essa é a real dona da pasta de dente cuja marca é Close-ápi. U de Unilevis.
Se Joãozinho Ancap fosse um pouco mais atento ele notaria esse detalhe. E não só isso. Ele notaria que as outras pastas de dente na prateleira do mercado, em sua grande maioria, pertencem a marca Unilevis. Inclusive ele notaria que, a pasta de dente supostamente “rival” que ele comprou para exercer o seu boicote também tem um Uzinho atrás.
Ou seja, Joãozinho Ancap deixou o mercado acreditando que fez um boicote quando, na verdade, ele só trocou o produto mas continua comprando da mesma empresa. A mesma empresa que decidiu fazer a propaganda com travesti para o produto Close-ápi.
Talvez, um jovem ancap lendo esse texto pense: “Ah mas então todos os produtos de higiene pessoal são da mesma marca? Ai ai Homero, isso é falso.”
Você está parcialmente certo amiguinho ancap. É falso que todos os produtos de higiene pessoal sejam da mesma marca. Na verdade não é uma marca só, provavelmente naquele corredor de produtos de higiene pessoal são umas 3 empresas. Ainda assim, você há de concordar comigo que não são tantas escolhas possíveis assim, não?
Mas, o problema do boicote do Joãozinho Ancap não termina aí.
Essa grande marca Unilevis, a dona de provavelmente mais da metade das pastas de dente do mercado, também, veja só, não é dona totalmente dela mesma.
Essa empresa é de acionistas e, existem acionistas maiores do que os outros. Dentre os acionistas dessa empresa, vamos imaginar que existam dois grandes fundos de investimento: o fundo BlackRosque e o fundo Wanderguarda.
Esses fundos de investimento são donos de empresas que controlam uma grande parcela dos produtos que existem disponíveis para a venda no mercado da cidade onde Joãozinho Ancap faz as compras. Ou seja, para Joãozinho Ancap realmente boicotar a empresa que decidiu fazer a propaganda com travesti ele precisaria deixa de comprar não só a pasta de dente mas sim a grande maioria dos itens do mercado que ele costuma ir, o que torna na prática seu boicote impossível.
Isso claro, levando em conta que o mercado que Joãozinho Ancap foi é um pequeno mercadinho local. Isso porque, se for uma grande rede de supermercados provavelmente Joãozinho Ancap descobrirá que essa rede em si também não pertence a si mesma mas, pertence a grandes fundos de investimento. Aqui novamente temos o dedo da Blackrosque e da Wanderguarda.
Ou seja não só os produtos dentro do mercado são de oligopólios trilionários (governados por bilionários transhumanistas neomalthusianos com complexo de Deus) mas, as redes de supermercados em si também são deles. Isso na prática impossibilita qualquer chance real de Joãozinho Ancap boicotar o sistema.
Ademais, ele ficaria, se soubesse, ainda mais surpreso em saber que esses grandes fundos de investimento são donos parcialmente um do outro. Isso parece em um primeiro momento algo absurdo e ilegal mas, é a verdade. O fundo BlackRosque possui uma fração do fundo Wanderguarda e o fundo Wanderguarda possui uma fração do fundo BlackRosque.
Ou seja, esses fundos que, em teoria competiriam entre si, não competem na prática pois um é dono do outro e vice versa. Então, como um possui ações do outro, nenhum tem o interesse econômico do que o outro falhe.
Poder-se-ia descer ainda muito mais dentro dessa toca de coelho isso pois, empresas não se autogerem. Elas são geridas por pessoas em posições de poder. Essas pessoas fazem parte de famílias dinásticas anticristãs que controlam o ocidente desde o início do período iluminista. Contudo, por motivo de prudência, não cabe aqui apontar o elefante na sala.
Acreditamos que ir somente até aqui já é o suficiente para demonstrar a impossibilidade prática do voluntarismo libertário por trás da frase “Ninguém deveria ser obrigado a comprar nada.”. Mesmo que essa proposição em teoria seja verdadeira de um ponto de vista ética ainda assim, existe um abismo muito grande entre teoria e prática.
Na prática, no atual estágio de desenvolvimento da civilização humana, é impossível boicotar grandes empresas. O boicote nesse caso não serve, nesse caso não funciona uma vez que boicotar grandes empresas inviabilizaria completamente a sua vida de um ponto de vista prático. Busque saber quantas empresas a Blackrosque possui frações. Você está usando o Google Chrome para ler esse artigo?
Mas voltemos ao nosso amigo Joãozinho Ancap.
Aqui lembramos novamente a máxima do filme Matrix. As pessoas aceitam serem controladas pelo sistema (não serem livres) contanto que elas tenham a ilusão da escolha. Joãozinho Ancap voltou para casa acreditando que mudou o mundo, que exerceu o direito ao boicote e que é um anarcocapitalista lutando contra o sistema. Ele esvaziou a sua raiva contra a máquina satanista que controla o mundo ocidental e agora seguirá os próximos dias crente de que fez alguma coisa mas, mal sabe ele que o mundo continua igual.
Joãozinho Ancap escolheu outro produto mas, tudo continua igual. Através da sua mudança de escolha por outro produto, nada mudou. Aqui, cabe a frase do escritor italiano Giuseppe di Lampedusa no romance O Leopardo: “É preciso que alguma coisa mude para que tudo permaneça como está.”
Salve Homero.
Levando em conta a dicotomia de Bauman, de que para se ter liberdade precisaríamos abrir mão de certa segurança, e de que para ter segurança precisaríamos abrir mão de certa liberdade, estaria Bauman refutado pelo pós modernismo já que hoje não temos nem liberdade e nem segurança?
Levando em conta que no nosso sistema os agentes não sabem que são agentes, que o pensamento do Joãozinho não é do Joãozinho, você acredita que o aumento da criminalidade nas ruas, que promovem o autotrancamento da população em suas casas, que os fazem evitar de saírem em certos horários, seria um espécie de toque de recolher moderno, velado, não sendo apenas um toque de recolher explicito?
Ainda na dicotomia entre liberdade e segurança, podemos considerar, caso o pensamento esteja correto, de que ao escolhermos liberdade, perdemos segurança, e sem segurança ficamos sem liberdade, que liberdade na verdade seria uma ilusão? um mero estado psicológico e que não se da para ser livre no sistema que vivemos hoje?
Parabéns pelo conteúdo Homero.
Salve, Homero !Nesse atual nivel de complexidade de produtos tecnologicos no mundo, nenhum pais emergente conseguira alcançar a China ou Eua, se hoje mesmo o Brasil virasse uma Ditadura Nacionalista poderiamos ter uma melhor qualidade de vida daqui 20-30 anos, mas não no nivel americano-chines, fale white pills para o futuro do nosso brasil para levantar o animo do ouvinte jovem como eu que sabe que nunca vai se aposentar e possivelmente não terei filhos para cuidar de mim, e abre um onlyfans Homero, queremos ver sua careca.